A Ilha Perdida (Maria José Dupré)


A história de dois irmãos que resolvem explorar uma ilha próxima à fazenda na qual estão passando as férias. Esse livro lido por uma infinidade de pessoas em suas infâncias, na célebre Coleção Vaga-Lume, é um dos maiores clássicos infanto-juvenis brasileiros, apresentado a nós através das hábeis mãos de Maria José Dupré, também autora de toda a coleção do cachorrinho Samba, dos quais A Mina de Ouro me marcou profundamente. Muito mais que A Ilha Perdida, que eu fui ler quando já estava na oitava série, e não necessariamente uma criança mais.
No entanto, o livro fez parte da infância dos meus pais, e cresci ouvindo sobre ele.
O livro começa muito depressa, e também termina rápido demais – são 127 páginas que passam rapidamente, e queremos ficar mais tempo naquela ilha ao lado de Simão e seus companheiros. Em alguns momentos, minha impressão é de que ela está escrevendo de maneira fantasiosa uma aula de conscientização ecológica do melhor estilo “preserve e respeite a natureza”, e o grande quê do livro se encontra realmente no final, quando Henrique finalmente consegue a liberdade para que possa retornar para a prainha, encontrar seu irmão, e ir de volta para a fazenda na jangada construída por Eduardo para que pudessem regressar.
É a típica aventura juvenil – dois meninos (de 14 e 12 anos) imaginam quais podem ser os segredos da chamada Ilha Perdida, uma ilha isolada no meio do rio Paraíba, que ninguém nunca pôde explorar. Com vários preparativos que duram uns dois dias, aproximadamente, eles partem sozinhos em uma canoa da fazenda para finalmente conhecer e desbravar aquele lugar. Mas as coisas que lhes acontecem lá estão além do imaginado. Eles rapidamente se perdem ao andar pela Ilha, incapazes de retornar ao lugar onde a canoa está amarrada, e uma ameaçadora enchente acaba por levá-la embora mais tarde, deixando-os na Ilha sem nenhuma possibilidade de retorno.
Os oito dias que eles passaram naquele lugar foi muito diferente para um e para outro. Após encontrar uma prainha, do outro lado da ilha, Eduardo retornou para buscar as coisas que tinham deixado para trás, enquanto Henrique, deixado sozinho, acaba levado prisioneiro de Simão, um homem barbudo que mora sozinho naquela ilha, em constante contato com a natureza, com vários amigos animais, entre eles cinco micos muito simpáticos, uma oncinha que mais parece um gato, uma coruja e um morcego que sempre saem durante a noite, um papagaio bastante tagarela, e Lucas, um veado que os visita diariamente. Animais esses com quem Henrique desenvolve uma bonita conexão, lentamente aprendendo a amá-los, e é muito bonito.
Grande parte do romance de Maria José Dupré é exploração da natureza e de uma vida profundamente humana naquele espaço incomum. Ela confere características humanas a um grupo de animais que vivem isolados na mata – como um funeral bastante tristonho e melancólico para um veado que morre, e um julgamento bastante real para um grupo de micos que foram flagrados roubando frutas. Além, é claro, da Caverna de Simão que parece muito uma moradia, com direito a pão e tudo o mais! Desse modo, a leitura fica mais fantasiosa e encantadora a olhos jovens, que desejam estar ali naquele lugar, e nem ao menos questionam a veracidade de todo o acontecimento.
Ou você questionou na infância?
Atualmente, o livro me chamou muito mais a atenção por seu desfecho já esperado: pela maneira como Simão deixou que Henrique voltasse para casa, mas não podendo levar absolutamente nada da caverna, usando exatamente as mesmas roupas que usava quando foi para lá – e ainda autoriza o garoto a contar sua história, uma vez que “ninguém nunca o encontrará”. Essa confiança de Simão de que ninguém o encontrará se o procurar, e que apenas Henrique poderia visitá-lo, sozinho, em algum outro momento, além do incontestável fato de não termos prova alguma além da palavra de Henrique a respeito de tudo isso nos deixa intrigados. E, convenientemente, Henrique é encontrado dormindo no meio da mata por Eduardo…
E quantos dias depois?
Infelizmente (ou não), fica difícil acreditar que as histórias de Henrique tenham de fato acontecido; e essa questão toda do tempo, enquanto na fazenda parecem ter se passado apenas uma semana ou 8 dias, enquanto na Ilha Perdida, para Henrique, evidentemente muito mais disso passou… como se ele tivesse morado semanas com Simão, aprendendo a rotina dos dias da semana, subindo em árvores com Um-Dois-Três-Quatro-Cinco, tecendo sandálias, pescando, tentando fugir, com direito ainda a dias sem qualquer novidade. Ele está, portanto, completamente desnorteado em questão de tempo, e de quantos dias passou na Ilha, o que isso quer dizer? Só mais uma prova de que a estadia na Caverna de Simão nunca aconteceu de fato?
Tais histórias podem ser a mente fantasiosa de uma criança que acredita naquilo de verdade, ou mesmo um menino jovem que não soube lidar com todo o medo de estar perdido na Ilha, sem ter como voltar. Uma fuga, um sonho envolvente, ou mesmo devaneios oriundos de uma febre, como a própria autora levanta em suas teorias. Mas para Henrique não, para Henrique tudo aconteceu, mesmo que no retorno à Ilha, com mais muita gente, ninguém tenha visto Simão ou mesmo os animais que ele conheceu… mas quer saber? Quem se importa? Desde que para Henrique isso tenha de fato acontecido, e estará para sempre em sua memória (“Até um dia, Simão!”), então tudo foi real, não foi? Visitar a Ilha Perdida é sempre uma aventura deliciosa, devíamos fazer isso com mais freqüência!

Mais livros assim, EM BREVE.
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Comentários

  1. Foi o primeiro livro que li da série Vaga-lume. Bem legal. Devia ter uns dez anos, e pintava todas as ilustrações com meus lápis de cor da escola. Interessante a sua interpretação, principalmente sua opinião em relação ao tempo na ilha e a veracidade do que aconteceu com o Henrique. Não me atentei a isso. kkk

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    1. Na verdade, é mais ou menos como eu disse no texto: tampouco me atentei a isso quando li pela primeira vez. É bacana como nossa "leitura" muda com o passar do tempo... hoje em dia, não consigo ler e não pensar assim haha Mas isso torna o livro ainda mais fascinante, essas possibilidades todas! :P

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  2. Li a obra na minha infância. Minha irmã tomou emprestado para mim numa biblioteca pública. Levei alguns dias para terminar e gostei muito.

    Hoje uma obra com uma licença literária tão grande seria impensável. Eu realmete acreditei na época, que o Rio Paraíba era imenso e que no meio dele poderia haver uma ilha tão grande ao ponto de virar um esconderijo impenetrável de um homem e centenas de animais.

    A internet, que trouxe a informação instantânea e infinita, também matou um pouco desaa magia.

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    1. Infelizmente, isso é verdade :(
      Não tinha parado para pensar assim!

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